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Mistura de pensamentos, reflexões, sentimentos; um risco, assumido; uma provocação, em tom de desafio, para que outros desçam ao terreiro; um desabafo, às vezes com revolta à mistura; opiniões, sempre subjectivas, mas normalmente baseadas no estudo, ou na experiência ou na reflexão. Sem temas tabu, sem agressividades inúteis, mas sem contenção, nem receios de ser mal interpretado. Espaço de partilha, que enriquece mais quem dá que quem recebe.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015


PRISIONEIROS E CARCEREIROS
 
Nelson Mandela é o exemplo mais conhecido de como é possível ver um carcereiro ser chamado à tomada de posse de um presidente que foi seu prisioneiro. Prisioneiro e carcereiro têm de perceber que estão em posições diferentes, antagónicas, mas não são necessariamente inimigos. Podem cumprimentar-se com respeito e, quiçá, até com alguma simpatia.
 
Havia numa prisão dois carcereiros: um, a que chamaremos o carcereiro mau, era, como o nome sugere, violento para os prisioneiros, sujeitando-os às maiores sevícias, ultrapassando tudo o que a lei e os superiores lhe exigiam, entrando no domínio da perversão de gostar de ver o prisioneiro sofrer; o outro, o carcereiro bom, era diligente no cumprimento das suas funções, mas sempre que podia evitava infligir mais dor na pena que o prisioneiro já era obrigado a sofrer e, não raro, associava-se à sua dor e procurava amenizá-la.
Em determinada altura o diretor da prisão, por razões de organização interna, determinou que um dos carcereiros passaria a exercer vigilância no inverno, enquanto o outro passaria a trabalhar nas três restantes estações, ou seja, primavera, verão e outono. E, num assomo de democracia, definiu que seriam os prisioneiros a escolher o carcereiro que ficaria num período e qual o que ficaria no outro.
Pareceria lógico que o prisioneiro escolhesse o “carcereiro bom” para os dias mais amenos de março a novembro, pois lá diz o ditado popular que “enquanto o pau vai e vem folgam as costas”. Inexplicável seria ver o prisioneiro optar pela solução inversa, preferindo ter o “carcereiro mau” a infernizar-lhe a vida a maior parte do ano. Só um masoquista faria essa opção.
 
Obviamente que a estória acima contada é irreal, e traça um retrato caricatural (propositadamente exagerado) do carcereiro bom e do carcereiro mau. Mas tem um claro e didático objetivo em mente.
Vamos admitir que os carcereiros são PS e o PSD. Os prisioneiros serão, naturalmente, o CDS, o PCP e o BE. Os prisioneiros nunca deixarão de ser prisioneiros e os carcereiros sempre serão carcereiros. Cada um no seu papel. Mas se os prisioneiros puderem escolher o carcereiro custa a perceber que deixem, quanto mais não seja por omissão, que o carcereiro mau assuma o controlo da prisão a maior parte do ano.
Falando agora com seriedade gostaria de referir algumas ideias que considero importantes:
1 - acho que o voto útil é uma séria limitação da democracia. Cada partido deve explicitar claramente as suas opções em matérias importantes, deve apresentar-se a eleições com o seu próprio programa e nele devem votar todos os que se identifiquem com os seus princípios e valores.
2 – quem ganha as eleições deve governar com o seu programa e não com o programa de outros, ou com cedências em matérias inegociáveis.
3 – um governo de maioria absoluta assente numa bipolarização artificial é pouco democrático. E em lugar de termos um governo com “rédea curta” passaremos a ter um governo em “rédea livre”.
4 – caso haja necessidade de acordos interpartidários para garantir a governabilidade, estes implicam necessariamente cedências de parte a parte. Mas nunca podem ser cedências em questões essenciais. Nem o partido maioritário deve aplicar as receitas do partido minoritário nem este pode ser desrespeitado. Mas vejamos um exemplo em que não pode haver cedências: um partido maioritário que defende a permanência no euro não pode de modo algum fazer um acordo que implique aplicar a receita do outro, que defende a saída do euro. Mas tal não invalida que possam estar de acordo em muitas outras matérias. Aquele tema é intocável, e ponto final. Isto só por si não deve nunca pôr em causa a governabilidade do país. Nem devem cair na lama os “parentes” do partido minoritário por não ver aplicada a sua receita, nem o partido maioritário pode, nesta matéria transcendente, fazer quaisquer cedências.
5 – Vale tudo isto por dizer que aceito pacificamente os resultados das eleições e acho que deve governar com o seu programa quem for chamada a formar governo e tenha (ou venha a conseguir) o necessário apoio parlamentar. A questão que se coloca é apenas esta: vai-se conseguir um apoio parlamentar à custa de quê ou de quem?
Tenho dado por mim a pensar no que representa haver recorrentemente uma maioria sociológica no pais e no parlamento (PS+PCP+BE) mas que não consegue governar e entrega de mão beijada o poder a uma clara minoria, a quem se tem de reconhecer o mérito de saber transformar um resultado eleitoral negativo numa via para a governação, a claro contragosto do povo. E não estou aqui a questionar os méritos ou os deméritos de uma qualquer governação, mas apenas a assinalar o demérito de quem não sabe transformar uma clara maioria sociológica num projeto viável de governo, por muitas e profundas divergências que haja no seu eleitorado a propósito de questões fundamentais. Quando não podemos escolher o caminho por onde queremos ir, possamos ao menos escolher o caminho por onde achamos que não devemos seguir. Chama-se a isto optar pelo mal menor. E não há mal nenhum nisso.
Por isso vejo com estupefação o papel do PCP e do BE, partidos com forte expressão parlamentar, colocados em clara posição de charneira, mas que se têm colocado sistematicamente fora do arco da governação. Acho (é minha opinião convicta) que qualquer destes partidos, nomeadamente o BE, poderia ter um enorme incremento eleitoral, passando a ser inequivocamente o terceiro partido do nosso espetro partidário, a morder os calcanhares ao segundo, caso viabilizasse um governo do PS, porquanto evitaria o apelo ao voto útil e os seus eleitores poderiam, simultaneamente, expressar em liberdade e sem temores o repúdio a uma política ou um partido sem apoiar claramente uma outra que também não lhe agrada ou em cujos dirigentes partidários não confia. E para tal não precisaria de ceder um milímetro nos valores que defende nem precisaria de passar a sofrer o desgaste de um partido que assume responsabilidades na governação. Poderia continuar fora do governo e de mãos livres para fazer oposição e defender os seus valores e as suas propostas. Só não poderia obstaculizar (inutilmente, como até agora) as medidas que, para o bem e para o mal e quer queira ou não queira, precisam, na opinião dos maiores partidos, de ser tomadas. Fazem-me lembrar o D. Quixote que, apesar de ter um cavalo e uma espada, malbarata os seus bens e as suas energias lutando contra um inamovível moinho de vento.
  As propostas do PCP e do BE aceitam-se ou não se aceitam, pode-se concordar ou não com elas. São tão legítimas quanto as dos outros partidos. Mas nunca percebi a estratégia destes partidos. Parece que preferem que o carcereiro mau tome conta da prisão na maior parte do ano. Será que são masoquistas, ou estão-se marimbando para o povo, que dizem defender?
Nota final: acho que quem ficaria a perder com uma alteração estratégica do comportamento do PCP ou BE seriam o PS e a PàF. No PS, não mais iria cair um voto dito “útil”, arriscando-se este partido a passar a ser um eterno segundo. Quanto à PàF, poderia ficar arredada do poder por muitos anos. Mas (e sem estar a pôr em causa os méritos das propostas do PS ou da governação do PSD) acho que a democracia é que sairia a ganhar.

quarta-feira, 29 de julho de 2015


OS GENES DA PREPOTÊNCIA ENRAIZADOS NO NOSSO ESTADO

Começo por esclarecer que não confundo estado com governo. O episódio que vou relatar pouco ou nada tem a ver com o atual governo, muito embora haja “tiques de autoritarismo” mais salientes em determinados governos, que depois se repercutem nas diversas instituições que são o braço armado do estado.

Estava eu na passada segunda-feira a fazer uma sessão de quimioterapia no IPO do Porto quando entrou no serviço um senhor em cadeira de rodas, aparentando 70 e muitos anos. Também poderiam ser apenas 60 e poucos, mas o estado de evidente degradação física levaria, nesse caso, a que aparentasse muitos mais.

A cadeira de rodas era conduzida por um garboso militar graduado, que se postou ao lado do doente desde que ele iniciou os tratamentos.

Pouco tempo passado irrompem pela sala de tratamentos 2 soldados com camisolas azuis com gravações nas costas a dizer “GUARDA PRISIONAL”. Ninguém ficou com dúvidas sobre o estatuto do doente. Mas muitos se terão perguntado se tal demonstração de força da polícia era proporcional ao perigo que o doente representava no estado de degradação física que aparentava, e certamente com a doença grave que aportava. Outro aspeto revoltante foi constatar que cada doente só poderia levar um acompanhante e aquele doente levava 3. Mais ainda – entravam na sala e movimentavam-se com o à vontade que o estatuto da autoridade lhe conferia, com os ostensivos cassetetes presos no lado esquerdo do cinturão e uma avantajada e moderna arma automática no coldre, no lado direito.

Mais um exemplo de como as nossas autoridades gostam de demonstrar a sua força perante os impotentes e indefesos. E certamente viajaram todos num carro celular com umas minúsculas janelas gradeadas, não vá o doente ser um campeão olímpico e poder escapar-lhes na sua veloz cadeira de rodas.

Há hábitos que dificilmente mudarão e regras que nunca serão adaptadas às circunstâncias reais em que os agentes de autoridade têm de atuar. Há regras que  os funcionários têm de cumprir, por mais anacrónicas que sejam e por mais inútil que seja o custo que geram.



quarta-feira, 24 de junho de 2015


NINGUÉM FOGE À MORTE NEM AO PAGAMENTO DE IMPOSTOS (???!!!)

Costuma dizer-se que na vida só há duas certezas incontornáveis: morrer e pagar impostos. Quanto à primeira “verdade”, não restam dúvidas. Já quanto à segunda tenho muitas e fundadas reservas. É verdade que cada vez se consegue fugir menos aos impostos e mesmo os chico-espertos são frequentemente apanhados na curva. Mas os verdadeiros especialistas continuam a cantar de galo e invariavelmente ganham ao fisco no jogo do gato e do rato. Como nos desenhos animados o gato (o fisco) faz o papel de lorpa, que não consegue nunca apanhar o finório ratinho.

Mas hoje queria falar da outra certeza: a morte. Mas fá-lo-ei de forma ligeira, através da recriação de um conto que me ficou de memória da juventude, e que li na chamada “Selecta”, livro de leitura obrigatória no secundário. A história passava-se no médio oriente, num ambiente das mil e uma noites.  

Vou recriar a história na atualidade, situando-a em Portugal.

 

O Maia era o patriarca de uma família cigana, na casa dos 60 anos, que vendia todo o tipo de artigos de vestuário na feira de Espinho. Naquela segunda-feira tinha deixado a barraca entregue a familiares e tinha-se deslocado a Guimarães atrás de um excelente negócio numa fábrica de confeções que tinha necessidade urgente de resolver alguns problemas de tesouraria.

Nesse mesmo dia, logo pela manhã, a morte apresentou-se ostensivamente na feira e não se coibia de anunciar a todos por quem passava, ao que ia: fazer a ceifa do dia, daqueles que constavam da sua lista para aquela zona. Visitou também a barraca da família Maia e o seu ar sinistro não deixava dúvidas sobre os seus propósitos.

- “Vai-te embora, desgraçada. Não te queremos por aqui”

- “Ah, ah, ah!!!” -  riu a morte, com um frio cinismo e um brilho de prazer no olhar. “Vou dar uma volta pelas redondezas e volto antes do final do dia. O vosso patriarca que espere por mim, pois tenho uns assuntos a tratar com ele”.

E abalou para o trabalho, que incluía levar uma data de acamados, provocar alguns AVC’s fatais e mandar para os anjinhos uns tantos doentes crónicos.

A família cigana de pronto ligou ao patriarca Maia a avisá-lo da visita da morte e do perigo iminente que corria, aconselhando-o a que não voltasse nesse dia a Espinho e se afastasse para o mais longe possível.

O Maia, que ao longo da vida até já tinha sido um aliado da morte, entregando-lhe algumas vítimas, sabia bem o real perigo que enfrentava. Mal fechou o negócio na fábrica, já com o seu velho mas potente BMW atulhado de mercadoria, resolve fugir na direção da fronteira de Espanha, esperando chegar depressa ao outro lado, para melhor poder fugir da terrível ameaça que pairava sobre a sua cabeça.

Entretanto, a morte, cumprido o essencial da sua missão, a meio da tarde volta à feira de Espinho, à barraca da família Maia, que a recebe de facas afiadas, vociferando ameaças caso acontecesse algo ao seu patriarca. Mas a morte não se deixou minimamente intimidar. Com ar gélido e sinistro limitou-se a anunciar que não podia ficar com eles mais tempo. Tinha de partir de imediato para uma missão bastante longe dali, pelo que não tinha mais tempo a perder com a família.

- “Adeus, até á próxima”

E abalou lesta, deixando no ar o som sinistro de uma risada trocista.

 

No dia seguinte um jornal diário anunciava: Ontem, cerca das 18 horas, perto da fronteira de Quintanilha, um automóvel despistou-se, galgando o rail de proteção e precipitando-se numa ravina de 20 metros. O acidente terá como causas prováveis o excesso de carga e velocidade acima dos valores permitidos por lei, a que poderá estar associada alguma falha nos travões da viatura, já com muito anos e deficiente manutenção. O automóvel era conduzido por um feirante de Espinho, de etnia cigana, que teve morte imediata.

terça-feira, 16 de junho de 2015


ONDE ESTÁ A FELICIDADE?

Juro que a história que vou contar é verdadeira e passou-se comigo. Aliás, não teria o mínimo interesse se fosse ficção.  

Em tempos eu tinha por vizinhos um casal na casa dos 70 e tal anos, que entrou numa fase de quezílias permanentes. A senhora andava de rastos e ao mínimo pretexto desatava a chorar, queixando-se amargamente e sem falsos pudores dos maus tratos que o marido passou a infligir-lhe, infernizando-lhe a vida.

Por vicissitudes várias tive de alterar a minha morada e deixei de ter contacto com o referido casal. Meses depois, num dia soalheiro, voltando a passar perto da minha antiga habitação, encontrei a referida senhora a passear o marido, agora numa cadeira de rodas. Ele fixou-me com olhar hirto e distante, não manifestando o mínimo sinal de me ter reconhecido. Perguntei o que tinha acontecido, ao que ela me respondeu que o marido tinha sofrido um AVC e teve uma rápida investida de Alzheimer, que o atirou para aquele estado.

Estranhei o ar feliz da senhora, que andava toda sorridente a passear o marido, sem qualquer sinal de agastamento ou cansaço. Fiz-lho notar, ao que ela me respondeu de forma desconcertante: “sabe, é que ele agora já não ralha comigo nem me bate”.

E esta, hem!

 

quarta-feira, 27 de maio de 2015


O FUTURO DA SEGURANÇA SOCIAL

Voltou a ser colocado bem em cima da mesa e de forma muito acesa a discussão sobre o futuro da segurança social no que respeita ao seu financiamento e ao valor das pensões a atribuir aos beneficiários que, com tal objetivo, procederam aos necessários descontos, juntamente com as respetivas entidades patronais.

O tema é-me muito caro e sobre ele venho escrevendo desde há muitos anos, incluindo um capítulo no meu livro “Economia em contramão”, pelo que me dispenso de aqui proceder à análise das causas e ao apontar de possíveis soluções, limitando-me agora a referir apenas um dado “novo” do problema.

Em minha opinião o grande drama do nosso processo de ajustamento não foi o aumento da carga fiscal, por muito brutal que este tenha sido. O grande drama do nosso processo de ajustamento foi o lançamento de centenas de milhares de pessoas no desemprego e a eliminação de milhares de empresas ditas ineficientes (na maior parte dos casos isso era verdade) mas que desempenhavam um importantíssimo papel no equilíbrio da nossa economia e, regra geral, prestavam serviços ou apresentavam produtos úteis e necessários, sendo por isso um grande “amortecedor dos solavancos” que a nossa economia originava no seu ineficiente processo evolutivo. E assim se fez recuar o nosso PIB para níveis de há mais de uma década.

Voltando à questão da segurança social: a reforma levada a cabo há quase dez anos pelo ex-ministro Vieira da Silva deveria garantir a sustentabilidade da segurança social por mais umas décadas, permitindo o equilíbrio financeiro do sistema e mantendo a solidariedade entre gerações. Que se passou então para voltarmos hoje a um debate, tenso, do tema, com sérios riscos de nova queda no valor das pensões e com desagradabilíssimas guerras geracionais? O grande problema ocorrido entretanto, o grande colapso - que deveria ter sido prevenido mas que era impensável na sua dimensão - foi o nível atingido pelo desemprego. Os seus efeitos são devastadores no equilíbrio das contas da segurança social, como já tive noutras ocasiões oportunidade de analisar. Nenhuma cabeça bem pensante iria admitir como possível, ainda há menos de uma década, que a taxa de desemprego chegasse a rondar os 18% (em níveis oficiais, mas subindo para perto de 30% nas contas de alguns analistas) e os dramas subsequentes iriam abater-se sobre a nossa sociedade, provocando em simultâneo o descalabro financeiro da segurança social e gerando lutas ideológicas intermináveis. E este problema, certamente mais que a subida dos impostos ou a queda do nosso poder de compra, vai prolongar os seus nefastos efeitos por muitas décadas. Mas agora que o mal está feito não adianta chorar e ter ilusões, até porque os verdadeiros culpados pela situação nunca serão responsabilizados. Nunca.

Voltemos agora a atenção para um tema (só) aparentemente lateral. Um dos graves erros das teorias liberais - que em muitos aspetos estão corretas e são teoricamente muito atrativas - é que olham apenas numa direcção e esquecem completamente aspetos colaterais que são importantíssimos. Ilustrarei isso com um exemplo que, não tendo aparente ligação com o tema acima abordado, na verdade apresenta uma umbilical ligação com o mesmo. No exemplo que vou apresentar os números que indico não passam de uma mera ilustração para se perceber a ideia que pretendo transmitir.

Admitamos que uma empresa sistematicamente apresenta custos anuais de 100 e recolhe apenas receitas de 99. É óbvio que esta empresa não tem futuro. E, de acordo com as teorias liberais, terá forçosamente de ser afastada do mercado. O grande problema é que o fecho desta empresa leva as receitas de 99 para 0, mas as despesas, ao nível da comunidade onde se insere, não passam de 100 para 0, mas apenas de 100 para 50. Num curto prazo (que se pode alongar por muito tempo) as receitas caem 99 enquanto as despesas só caem 50.

Este é o grande problema, em relação ao qual as teorias liberais assobiam para o ar. E os resultados depois são dramáticos, mas são sistematicamente escondidos atrás de uma cortina de fumaça.

PS – particularmente sobre este tema eu gostaria de receber comentários dos meus leitores.


terça-feira, 19 de maio de 2015


IMPROBABILIDADES – 3 HISTÓRIAS REAIS

Periodicamente vou ao cemitério da minha terra natal, onde estão sepultados os meus pais. Numa dessas visitas encontrei uma velha amiga, que tinha 2 irmãos da minha geração: o Quim, mais velho que eu 2 anos e o Américo, mais novo um ano.

Como já não os via há muitos anos, comecei por perguntar pelo Quim.

- Então não sabes? O Quim morreu há mais de 6 anos. Deu-lhe um AVC e foi-se.

Fiquei encavacado e sem palavras. Para me redimir, e por curiosidade e simpatia, perguntei pelo Américo.

- O Américo morreu na semana passada, e por isso é que eu hoje vim ao cemitério.

Há momentos em que o melhor era estar calado. Ou não sair de casa.

 

Um casal meu vizinho tinha dois carros, um usado por ele, outro por ela. Apesar de habitarem um apartamento com garagem, por mera comodidade habituaram-se a deixar o carro na rua, mesmo em frente à porta do prédio. Como trabalhavam em locais diferentes, desciam ambos ao mesmo tempo para ir para o trabalho, mas cada qual levava o seu carro. Como às vezes ela se esquecia da chave em casa e tinha de subir dois lances de escadas, passaram a usar o esquema de deixar a chave dela no carro dele. Um dia descobriram que estava vazio o lugar onde deveria estar o carro dele. Depois das habituais olhadelas em volta confirmaram que o carro tinha desaparecido. Decidiram então ir juntos para o trabalho, no carro dela. Mas ao olharem em volta constataram, incrédulos e consternados, que o carro dela também tinha desaparecido. Os larápios, ao verem uma chave no carro, perceberam que lhes tinha saído a sorte grande e não hesitaram. E o casal meu vizinho, na mesma noite, ficou sem 2 carros.

 

Mas agora vou terminar em beleza. No tempo em que o Continente sorteava carros entre os seus clientes uma amiga nossa teve a felicidade de lhe ter sorrido a sorte, sendo brindado com um simpático carrinho. E não é que no natal seguinte voltou a ser premiada com novo carro! Há horas de sorte, como costumam dizer os cauteleiros.


domingo, 17 de maio de 2015


SALÁRIOS DA FUNÇÃO PÚBLICA SOBEM 10%

Vamos já esclarecer o mistério. Não se trata de uma notícia, mas de um simples comentário sobre os perigos na análise das estatísticas. E isto tanto é válido para as estatísticas propriamente ditas como para previsões eleitorais ou situações afins.

Suponhamos que um organismo público anunciava uma estatística que nos informava que os salários médios na função pública tinha subido 10% no último ano. Seguramente iam chover cobras e lagartos por parte dos comentadores menos atentos ou menos informados. Contudo, essa alteração estatística pode ser perfeitamente correta e não estar associada a qualquer aumento nos salário dos funcionários públicos. Pode tratar-se simplesmente da consequência da redução de efetivos nas categorias mais mal remuneradas: se nos escalões mais elevados se mantiverem todos os efetivos o salário médio obviamente vai subir. O mesmo se passará em sentido inverso se houver apenas reduções nos escalões superiores: o salário médio descerá, e aí estariam os sindicatos a dar conta do seu descontentamento, sem uma sólida e factual justificação.

Vamos presumir que os organismos que fornecem estatísticas são confiáveis. Mas não confiemos tanto nas primeiras análises e esperemos sempre por ouvir o contraditório.