Texto

Mistura de pensamentos, reflexões, sentimentos; um risco, assumido; uma provocação, em tom de desafio, para que outros desçam ao terreiro; um desabafo, às vezes com revolta à mistura; opiniões, sempre subjectivas, mas normalmente baseadas no estudo, ou na experiência ou na reflexão. Sem temas tabu, sem agressividades inúteis, mas sem contenção, nem receios de ser mal interpretado. Espaço de partilha, que enriquece mais quem dá que quem recebe.

domingo, 30 de março de 2014

Passeio do Grupo 5.com(e) à Serra da Freita (V)


Vale de Cambra
Terminado o repasto havia que queimar os últimos cartuchos, antes de regressar a casa.
O que é bom acaba sempre depressa. Para não falar em outros exemplos (porventura de sabor mais intenso e excitante), recordo apenas a saudade dos adeptos de Mary Quant, quando diziam o mesmo: “o que é bom acaba depressa. Por isso é que a moda da minissaia durou tão pouco tempo”.
Descemos, assim, até Vale de Cambra, calmamente, para não apressar o tempo.
Aí preenchemos o habitual euromilhões, sempre com a expectativa e a promessa de que a próxima viagem seja de helicóptero, para saborear de forma condigna o jackpot que um dia, fatalmente, se atravessará no nosso caminho.
Ficamos numa acolhedora esplanada a conversar um pouco, enquanto ajudávamos a digestão com as águas da praxe.

Como vem sendo frequente - nem de propósito - estava numa mesa próxima um grupo de 5 (exatamente 5) jovens da nossa geração, com idades entre os 50 e os 55. 
Esclareça-se, porque a palavra “jovens” é ambígua, que se tratava de elementos do sexo feminino. Ficamos à distância estrategicamente conveniente: não demasiado próximos, para não nos inibir de falar à vontade; nem excessivamente longe para não se quebrar a corrente de interesse nem esbater o perfume do romantismo serôdio que nestas circunstâncias se estabelece. Pelo nosso traquejado faro concluímos que se tratava de um grupo de professoras. Provavelmente a conversa recaia sobre os testes a aplicar aos alunos ou sobre a má criação, tão em voga nos dias de hoje. Certamente já não se lembram das asneiras que faziam quando eram da idade deles. Ou falariam antes sobre as malfeitorias do governo, com alvo particular na vilipendiada classe dos professores?
Nisto aproximou-se alguém que tanto poderia ser o diretor da escola, como o homem das fotocópias. Mas a sua presença de pouco nos interessava, pelo que nem demos pela sua ausência, passado pouco tempo. Parece ter saído à sucapa, para não perturbar a nossa etérea contemplação.
O Bernardino ainda disse que noutros tempos não teria qualquer pejo em procurar uma aproximação, atrevendo-se temerariamente a meter conversa, confiante no sucesso da investida. Mas agora nem sequer ousou. Ficamo-nos por isso naquele tipo de conversa de velhos jarretas, como a raposa que, ao saber que não pode chegar às uvas, sabiamente limita-se a proferir o célebre: “não prestam. Estão verdes”.

Entretanto faziam-se horas para regressar a penates. Mas como o almoço tinha sido sóbrio e regrado, só o Rogério teve necessidade de procurar um “Toni” em Vale de Cambra, mas para uma visita rápida e descomprometida.
(Para quem não sabe: "Toni" é um local próprio para resolver problemas em casos de desarranjos intestinais)

Adeus até ao meu regresso
Este grupo é mesmo muito organizado. Já está prometido e alinhavado com pormenores mais uma ida a Trás-os-Montes, logo que mude a hora. Quase só falta acertar a data. Mas mais, enquanto esse longínquo e ansiado dia não chega, não podemos perder tempo. Tratou-se já da próxima viagem, tendo-se mesmo fixado a data e selecionado o local e a ementa: será em 7 de maio, novamente no Mira Freita, para voltarmos a saborear o cabrito serrano. Não é só pelo gosto de repetir: desejamos compartilhar estes inolvidáveis e saborosos momentos com as nossas consortes (com sorte), que sabemos estarem ansiosas por esse dia, há muito prometido e mais que por uma vez adiado.
“Uma vez sem exemplo”, ouvi eu no carro. E, como cronista fiel, não posso deixar de registar com precisão o que ouvi com estes que a terra há-de comer, mesmo que a expressão não traduza o verdadeiro sentimento de quem proferiu tão oportuna quão assertiva e assassina frase, embora sem lhe medir as consequências (obviamente, isto não pode sair daqui. Todos os cuidados são poucos e nestas coisas elas não perdoam).
Como não podia deixar de ser, o Mota ditou sábia sentença: “entretanto, e como o 7 de maio ainda vem longe, podemos no meio organizar um novo almoço só para nós, para desenferrujar a língua e não perder o ritmo” (a tradução é livre, pois a memória não registou a frase sic).
E sem mais nada de especial digno de registo acabamos por chegar a Valadares. Aí nos despedimos com um até já, já com saudades do futuro encontro no Mira Freita.

O secretário/cronista
Alexandre Ribeiro

Nota final: O vídeo já nem era necessário mas... "o prometido é devido"! Quem quiser ver a reportagem fotográfica integral pode consultar o blogue "VYLAPENEDO" (basta clicar na minha lista de blogues no lado direito desta página).


sábado, 29 de março de 2014


Alguém acredita mesmo?


 

Um conhecido empresário afirmou recentemente que a produtividade dos alemães é 3 ou 4 vezes a produtividade dos portugueses. O que efetivamente está a dizer é que o nosso trabalho rende pouco, talvez por sermos “malandros”.

Afirmações deste tipo são recorrentes e, sem nada ajudarem a resolver, só servem para amesquinhar o orgulho dos portugueses e para gerarem um sentimento (contido) de revolta.

Naturalmente importava saber se a afirmação tem alguma sombra de verdade ou se é apenas uma tentativa de justificar o baixo nível dos nossos salários.

Em que é que se baseiam determinadas sumidades para afirmar que a produtividade dos alemães é 3 ou 4 vezes a nossa?

Até podemos dar de barato que os alemães possam ser mais produtivos, mais organizados e mais espartanos que nós. Mas serem 3 ou 4 vezes mais produtivos? Já repararam na enormidade?

Será que um trolha alemão assenta em cada hora 4 vezes mais ladrilhos que um trolha português? Será que um recepcionista de hotel atende 4 clientes ao mesmo tempo? Será que uma empregada de limpeza faz numa hora 4 vezes mais camas que uma portuguesa? Será que um professor dá aulas a turmas de 100 alunos? Será que um motorista conduz 4 camiões ao mesmo tempo, ou faz uma viagem entre 2 cidades num quarto do tempo do português? Será que de uma linha de montagem de automóveis na Alemanha saem 4 vezes mais carros que da Auto-Europa? Será que uma alemã, empregada de caixa de um supermercado, regista os artigos 4 vezes mais depressa que uma portuguesa? Ou, num registo ainda mais irónico, uma equipa de futebol alemã entrará em campo apenas com 4 jogadores? O tempo de gestação de uma mulher alemã será apenas de 3 meses? Ou será que um alemão trabalha 30 horas por dia, 600 dias por ano? Acredito mais que sejam alguns empresários que estão a exigir estas performances aos seus subordinados para, finalmente, termos a mesma produtividade dos alemães.

Os números que toda a gente conhece e que são indesmentíveis é que os alemães ganham 3 a 4 vezes o que ganham os portugueses. E também não é raro encontrar-se um parafuso produzido na Alemanha (ou vendido por alemães) a um preço n vezes superior ao preço de um parafuso idêntico produzido e/ou vendido por portugueses.

Se alguém tiver números para provar que a produtividade dos alemães é tão maior que a nossa, eu gostava de os conhecer. Mas, até agora e em relação a este tema, só tenho ouvido “bitaites” de quem fala de barriga cheia.

De facto o nosso exército é completamente inútil, pois com patriotas destes não precisamos de inimigos externos.

sexta-feira, 28 de março de 2014

Passeio do Grupo 5.com(e) à Serra da Freita (IV)

Finalmente no Mira Freitas
Depois de uma descida até ao sopé da serra finalmente chegamos ao Mira Freita, em Felgueira, o ponto mais almejado desde a nossa saída, local onde iríamos confortar o estômago e proporcionar uma onda de requintados prazeres ao palato. Faltavam ainda 5 minutos para a hora marcada. O Mota programou a coisa com todo o rigor.
O restaurante é enorme, com espaço para quase 200 comensais, com amesendação simpática, a não merecer qualquer reparo. Como era meio da semana a afluência era escassa, deixando-nos à vontade para uma conversa descontraída, mesmo que porventura viesse a descambar para o desbragamento (o que obviamente não aconteceu, como é apanágio deste grupo).
Pelas bandeiras portuguesa e suíça ostentadas em frente ao edifício, que a brisa fazia ondular nos mastros em suaves movimentos, concluímos que o restaurante pertenceria a um português provavelmente ex-emigrante na Suíça que, soubemos, agora produzia vinho numa quinta em Sever do Vouga.
Comodamente instalados, passamos ao que interessaAbrimos as hostilidades começando
por uns tradicionais rojões de porco conservados no pingue, à antiga (que deixaram o Mota a calcorrear com nostalgia os caminhos e sabores da infância) acolitados por saborosa morcela tradicional caseira.
Para melhor aconchego mandamos vir um verde tinto da “Quinta do Patrão”, leve e saboroso, servido em pequenas canecas, o que obrigou o empregado a ter de proceder ao reabastecimento vezes sucessivas.
E veio então o cabrito, servido em assadeira de barro, com honras de verdadeiro campeão, profusamente ladeado de folhas de louro. Um cabritinho daqueles que não enganam: carne tenríssima, nacos suculentos, assadura no ponto, tempero com sapidez milimétrica. A quantidade - 3 doses para 5 galfarros - foi exatamente quanto baste: deu para ficar plenamente satisfeito, embora se mais viesse não iria sobrar nada, com os inconvenientes que se conhecem. Como acompanhamento veio um arroz malandrinho de carqueja, com as flores
da dita a boiar à superfície. Em complemento ou alternativa havia legumes, batata cozida e nabos.
A lista de sobremesas, não sendo extensa, era suficiente. Quantidades generosas, sabor agradável. Para culminar esta refeição de príncipes da idade média, o serviço foi concluído com os inevitáveis cafés e umas reconfortantes aguardentes para os apreciadores.
A conta não ofereceu surpresas: 20 euros por bico, englobando já uma algo pífia gratificação ao garçon, sempre prestimoso, amável, discreto e eficiente.

Como "sobremesa" extra assistiu-se, na varanda voltada a sul, a um animadíssimo despique em matraquilhos, que opôs uma equipa mista Porto/Benfica (Rogério e Bernardino) aos declarados portistas Jorge e Alexandre. Depois de um robusto 5-1 na primeira partida, favorável aos portistas Jorge/Alexandre, os adversários acabaram por ganhar terreno, nas três restantes partidas, sempre renhidas e disputadas até ao fim, registando-se um empate e dois resultados tangenciais favoráveis à dupla mista Rogério/Bernardino.
CONTINUA

quinta-feira, 27 de março de 2014


EM CONTRAMÃO

É chegado o momento de clarificar um pouco melhor o sentido que dou à expressão “Em contramão”, que serve de título a este blogue. Nada melhor para esse efeito que usar uma metáfora.                            
Em Contramão” é como conduzir no meio de um bosque, numa noite escura, levando uma lanterna de bolso para ver melhor o caminho. Os faróis do carro só nos apontam numa direção: para a frente. Mas se levarmos uma lanterna podemos apontar para fora do caminho. A razão do uso da lanterna não é focar a estrada, pois para isso há os faróis. O objetivo é poder apontar para coisas e locais onde a luz dos faróis naturalmente não incide.
Por isso, “Em contramão” não é necessariamente “do contra”; é muito mais o apontar o foco para ângulos menos visíveis; é dar visibilidade ao lado lunar; é dar voz e argumentos a quem pouco pesa; é exercer o contraditório. Em contramão colocam-se muitos “ses” em situações onde há quem só veja certezas. É estar atento ao que se passa ao lado, em vez de só olhar em frente. Em contramão perspetivam-se alternativas e assinalam-se obstáculos num caminho que se desejaria, naturalmente, que fosse isento de perigos. Por tudo isto “Em contramão” é um espaço de diálogo, sempre aberto e sempre à espera de contributos dos seguidores.
Quando publico uma frase ou um comentário de alguém (que procuro, sempre que possível, identificar e situar), haverá uma natural tendência para concordar. Mas não é obrigatoriamente assim. A publicação significa que estamos perante um pensamento, um ponto de vista, um ângulo de análise que entendo que não deve ser ignorado.
A vida não é a preto e branco e tem, felizmente, muitos matizes. Não ver (ou não querer ver) essas nuances é redutor e pode revelar miopia ou daltonismo. E isso é sempre um perigo na “estrada”.
Temos de escolher os destinos para onde queremos ir. Temos de escolher os caminhos para lá chegar. E mesmo no caminho que estamos a seguir, seja ou não o que escolhemos, temos de contornar os buracos que formos encontrando, fugir das armadilhas de traçados mal projetados e estar atentos aos sinais de perigo, nem sempre perfeitamente visíveis, que vamos encontrando ao longo do percurso.
 

quarta-feira, 26 de março de 2014

Passeio do Grupo 5.com(e) à Serra da Freita (III)

Local das pedras parideiras
Avançamos talvez uns dois quilómetros, a caminho do local das famosas pedras parideiras, passando ao lado de uma pitoresca aldeia chamada Albergaria da Serra.
Mais para meter conversa que para pedir informação (a placa não deixava dúvidas), interpelamos um habitante local que nos apareceu ao caminho e que nos confirmou: Vão bem. As pedras parideiras são já ali. Mas nesta época não estão a parir nada.
Tal como a maior parte dos consultores de empresas, este aldeão não nos disse nada que já não soubéssemos. Mas é sempre reconfortante encontrar alguém que nos garanta que estamos no caminho certo e que sabemos como são as coisas. E lá fomos nós, agora muito mais serenos e confiantes, a caminho do sítio das pedras parideiras.
Daqui observa-se, sob outro ângulo, a frecha da Mizarela em toda a sua plenitude e imponência, em plácida e exuberante nudez da fenda e das rochas (granito e xisto) que a marginam. As águas revoltas deslizam em tropel imparável, descendo em turbilhão pelas descarnadas rochas da fenda, (ou pela fenda das rochas?) apressadas e ofegantes, ansiosas por chegar ao êxtase e à calmaria, no sopé do monte, onde, enfim, podem repousar e retemperar energias após tão alucinante viagem (que é que isto me faz lembrar?).
Voltemos às pedras parideiras, que são um fenómeno geológico raríssimo. No caso da serra da Freita são mesmo um caso único no mundo no que respeita a este tipo de granito. 
Cientificamente o fenómeno é assim: trata-se de uns afloramentos rochosos onde os
componentes da rocha se agrupam em vez de se distribuírem de forma mais ou menos uniforme por toda a rocha, formando nódulos que se destacam claramente pela sua cor escura. Ao fim de milhares (ou milhões) de anos a erosão, as condições de tempo (diferença térmicas e humidade) fazem estalar a rocha, que larga os seus rebentos. Daí a designação de pedras parideiras. O período de gestação é muito longo, o parto é muito demorado.
Por aqui os paparazzi são muitos, embora não se escondam atrás das árvores, nem precisem de binóculos para ver ao longe, nem de escadas para se sobreporem às sebes. Tal como os outros, estão sempre na expectativa de ver a rocha parir (os outros ficam à espera que a vedeta tire o soutien e deixe à mostra os seios nus, momento ansiado e que justifica tantas solitárias e desesperantes horas de espera, mas que afinal é a fonte dos seus proventos). Mas ninguém pode apressar este parto e transformá-lo num acontecimento social, com direito a fotos e filmes que certamente iriam receber muitos likes no facebook.
Mesmo à face da estrada vemos os afloramentos graníticos (não estou a inventar nem a fazer literatura. É assim que reza o panfleto), prenhes de pedras parideiras, na maior parte dos casos com os partos concluídos e com os filhotes já muito longe da casa paterna. Mas ainda há pedras com a gestação incompleta e sem data marcada para o parto, apesar dos meios tecnológicos de que hoje se dispõe para avaliar a data destes eventos. Neste aspeto, como em muitos outros, a natureza não se compadece com a pressa ou com os desejos dos homens. Há-de ser quando Deus quiser, dirão os crentes.
Mas para outras coisas (como a larica) a natureza pode apressar o “parto”. E para nos lembrar as regras lá estava o co-piloto Mota, novamente a carregar a fundo no “acelerador”: “Temos de nos despachar. É quase uma hora e já devíamos estar a chegar ao restaurante.”
“Ok Mota. Espera um pouco que já vamos”. E, sem pressas, ainda nos demoramos o tempo suficiente para comprovar que o Centro de Interpretação – Casa das Pedras Parideiras é uma estrutura muito bem organizada e dotada em meios técnicos e humanos, merecedora de todo o apoio e da gratidão de quem gosta de conhecer estes interessantes fenómenos com o máximo de rigor e cientificidade. Aliás, as próprias rochas podem ser visitadas em excelentes condições de conforto, seguindo por uma passerelle tipo passadiço, em madeira, que circunda a principal afloração e permite ver e tocar diretamente as rochas. Mas posso garantir que será infrutífera qualquer tentativa de provocar um parto. 
As entidades locais e a Arouca Geopark merecem os parabéns.
CONTINUA

terça-feira, 25 de março de 2014

JOSÉ MANUEL FÉLIX RIBEIRO

Autor de A ECONOMIA DE UMA NAÇÃO REBELDE

Excertos de uma entrevista à SIC Notícias em 22/03/2014

A Narayana Murtthy, fundador da Infosys, não lhe interessa nada o deficit do nosso país nem o custo da mão de obra quando equaciona a possibilidade de investir em Portugal. O que lhe interessa  é  saber: a)como é que estão os nossos alunos na matemática;  b) em línguas; c) em engenharia informática; d) se é possível gerir e recompensar  os talentos
Ainda na opinião de Narayana Murtthy: se queremos fazer coisas com baixos salários é perder tempo, porque isso há aos pontapés no mundo
As empresas americanas que vêm para Portugal não é pelo nível dos nossos  salários. É pelos nossos talentos na engenharia e conhecimentos de línguas
O estado tem de garantir a qualidade de vida aos seus cidadãos. E o povo tem de se organizar para que a economia cresça
Não foi o estado social que fez com que não crescêssemos. Mas foi porque não crescemos que agora não podemos ter o estado social que temos


segunda-feira, 24 de março de 2014

Passeio do Grupo 5.com(e) à Serra da Freita (II)

Santuário da Senhora da Laje
Já em plena serra da Freita, perto do lugar de Merujal, ao passar no recinto da Senhora da Laje, uma construção do ano 1680, descemos ao adro para tirar umas fotos para a posteridade. Mas o local era ermo, sem vivalma e sem qualquer casa num raio de muitas centenas de metros. Só uma igrejinha, carinhosamente intitulada “santuário”, com um típico coreto e um minúsculo cemitério mesmo ao lado, a lembrar o Portugal dos Pequenitos. Sendo, por isso, um local mal frequentado e pouco recomendável, optamos por dar meia volta e voltamos a subir à estrada. Aí, num largo terreiro rodeado de cruzeiros, o Bernardino fez o gosto ao dedo, premindo o gatilho a torto e a direito. 


Nem o Mota escapou ao seu zeloso profissionalismo, mesmo quando estava meio escondido atrás de um contentor de lixo a dar vazão, com inquestionável satisfação, às suas mais prementes e básicas necessidades fisiológicas.
Assistimos então a um momento mágico, de arte pura e sublime. Para a posteridade posou o Jorge, servindo de modelo para uma soberba foto que pode ser apreciada na magnífica reportagem fotográfica do Bernardino, que regista para sempre (agora no digital e não já no celuloide) os fugazes mas inolvidáveis momentos destas visitas turístico-gastronómicas.
Recuando 1981 anos, o Jorge assumiu com todo o rigor a pose do Cristo na cruz, com as mãos estendidas  cravados na travessa horizontal, cabeça pendida com ar de compungida resignação, com a perna direita artisticamente fletida, e com os pés sobrepostos para puderem ser fixados à base da cruz com um único cravo.
Como 1981 anos? Perguntarão os mais distraídos. Pois se estamos em 2014 e Ele morreu com 33 anos, é só fazer as contas e ver se não tenho razão! 

Frecha da Mizarela
Daqui em diante o caminho da serra estava desbravado. E lá fomos sem problemas desembocar (salvo seja) na frecha da Mizarela.
Frecha de Quem? perguntará qualquer inocente e incauto desconhecedor da enorme riqueza do património natural de Portugal, que só merece o nosso mais desdenhoso e reprovador olhar.
A frecha da Mizarela é um geossítio (quem não souber o que quer dizer este palavrão consulte o dicionário ou o roteiro turístico editado pela Arouca Geopark) que é tão somente a mais alta queda de água em todo o território continental português.
Apresenta um desnível superior a 70 metros, praticamente na vertical, com um caudal de vários milhares de litros por minuto (contas feitas de cabeça, em menos de um minuto).
Apreciada a frecha, mirada e fotografada pelo Bernardino em vários ângulos, de modo a não deixar dúvidas nem mistérios por descobrir, entra em acção o co-piloto Mota, carregando agora no “acelerador” do relógio: “Temos de nos despachar. O almoço está marcado para a uma hora e ainda temos de passar nas pedras parideiras.”
A Mizarela é um belíssimo lugar, com meia dúzia de casas serranas de muito bom aspeto, circundadas de “relvados” magníficos. Os telhados de colmo já desapareceram de cena, substituídos pela moderna telha-sanduíche. Ar puro, silêncio apenas cortado pelo fragor das águas da cascata. Mas tudo fechado, sem ninguém à vista desarmada. Até o restaurante tinha as portas trancadas. E no que respeita a cafés, nem sombras. 
Tem paciência, Jorge. Ainda não é agora. “Aguenta, aguenta”, como diria o Ulrich. Se fosse outra coisa seria bem mais doloroso.

Continua

domingo, 23 de março de 2014

PASSEIO À SERRA DA FREITA


De vez em quando este blogue também fará incursões literárias e apresentará crónicas, de viagens ou outras.
Começarei pela descrição/retrato de uma viagem à Serra da Freita, por terras de Arouca e Vale de Cambra. A crónica será dividida em 5 capítulos e complementada no fim com uma reportagem fotográfica, a cargo do meu amigo Bernardino Fonseca. O capítulo primeiro será o mais árido e menos entusiasmante, pelo que recomendo que leiam também o segundo capítulo. Depois, se não gostarem do estilo, desistam. Se gostarem, convido-os a seguirem connosco até ao regresso a casa. Votos de boa viagem.




PASSEIO TURÍSTICO/CIENTÍFICO/GASTRONÓMICO À SERRA DA FREITA


19 de Março de 2014 – Dia do Pai


Por uma feliz coincidência o Grupo 5.com(e) escolheu esta data marcante para se deslocar à serra da Freita, preenchendo a cheio mais um espaço no seu já interessantíssimo historial em roteiros turísticos, em visita de desfrute ao nosso  riquíssimo património geológico e, sobretudo, gastronómico.


O dia apresentou um sol radioso, com temperatura amena, feliz prenúncio da ansiada primavera, parecendo feito de encomenda para ir ao encontro dos nossos objetivos. A concentração foi em Valadares, no Penedo, onde à hora marcada compareceram o Jorge, o Bernardino e o Alexandre. O Mota, como vai sendo habitual, apareceu de “véspera” e já há muito esperava, impaciente, na pastelaria. O Rogério juntou-se depois ao grupo. E lá arrancamos, tendo como destino a Serra da Freita. E ao restaurante Mira Freita, porra. Não podemos lembrar o acessório e esquecer o essencial.


 O percurso e o papel importante do co-piloto


 O Alexandre era o condutor, mas contava com a preciosa e exigente cooperação do “experiente” co-piloto, o Mota: “Nada de pressa. Não precisamos de ir a mais de 80”.


 O Mota passava o tempo a acionar o “travão de boca”: “Cuidado nessa curva. Aqui não podemos ir a mais de 60”.


A certa altura, em plena autoestrada A32 e numa descida, o Rogério perguntou se o motor ia desligado para poupar combustível: “Não, mas vamos a 110 kms/hora, com o piloto automático ligado. Por isso é que parece que estamos parados”.


“Vamos assim muito bem”, atalha logo o Mota, que só se chateou por o Alexandre não ter saído em S. João da Madeira. “Vamos ter de fazer muito mais quilómetros. Devíamos ter saído onde eu disse. Eu bem avisei (a quem  é que eu já ouvi isto?). Agora já não dá para ir para trás. Não me quiseste dar ouvidos! Eu é que conheço esta zona. Trabalhei aqui muitos anos”.


Afinal a saída da autoestrada em Vale de Cambra ficava mesmo a 2 passos do ponto onde teríamos de passar. Ainda poupamos 10 a 15 minutos. E não foi preciso ligar a porcaria do GPS do Rogério (que, para variar, não funcionava direito) para se chegar à Freita sem problemas. Aliás, nada nos garantia que com aquele GPS e com aquele técnico não fôssemos antes encaminhados para Aveiro ou para o Porto (já não era a primeira vez que algo de semelhante nos acontecia por erro na introdução das coordenadas).


O caminho estava bem sinalizado e fomos diretos ao destino sem quaisquer problemas. Mas nem 5 pares de olhos nem o GPS nos indicaram qualquer café à face da estrada, onde o Jorge, ansioso por beberricar a sua poção mágica,  pudesse matar a traça, que desde a autoestrada lhe vinha corroendo as entranhas. Vícios.
(continua)

sábado, 22 de março de 2014


AUSTERIDADE

 

O excesso de austeridade está para a austeridade como passar fome está para uma dieta rigorosa, mas saudável e equilibrada.

 

Não é este o momento para abordar aqui a magna questão das responsabilidades e das culpas do que se passa em Portugal. É ainda e apenas o momento de reflexão sobre a doença e a dose do remédio que nos há-de curar.

Vamos admitir que não tinha havido crise em 2008, com todas as consequências - económicas, sociais e políticas, a nível interno e no mundo em geral – que são sobejamente conhecidas e que trouxeram até nós (e outros países) a troika e a austeridade. Não esquecendo os nossos erros e fragilidades, nem os omitindo na análise, façamos mesmo assim algumas projecções do que teria sido, em condições ”normais”, a evolução da economia portuguesa nestes últimos 6 anos:

- o nosso PIB poderia estar 10 a 20 mil milhões de euros acima do atual

- o rendimento disponível dos cidadãos poderia estar 5% a 8% acima do atual

- as receitas do IVA + IRS poderiam estar 8 a 12 mil milhões de euros acima do atual patamar

- provavelmente teríamos poupado, nestes 6 anos, entre 6 e 10 mil milhões de euros em juros

- a nossa dívida provavelmente teria crescido para 90% ou 95% do PIB, mas não para os 130% atuais, podendo estar mais de 50 mil milhões de euros abaixo do valor atual

- O desemprego até poderia ter subido para os 9% ou 10%, mas nunca para os mais de 16% onde já estivemos.

- muitas das nossas empresas “coxas” continuariam a arrastar-se, mas não teriam fechado portas. E algumas das empresas saudáveis que faliram continuariam a produzir riqueza e a dar emprego.

 

Obviamente que continuaríamos com os nossos problemas estruturais por resolver. Provavelmente continuaríamos sem perceber nem aceitar de bom grado que tínhamos de arrepiar caminho. Mas certamente, e se pudéssemos dispor de um governo de verdadeiros estadistas, não precisaríamos de mais 40 anos de definhamento e “perda de independência” antes de poder voltar a erguer a cabeça.

 

A dieta saudável e rigorosa é uma questão de bom senso e um imperativo para quem quer levar uma vida saudável. E uns dias de jejum e abstinência são muito saudáveis e só farão mal aos doentes. Mas a fome continuada é o caminho mais rápido para a degradação física, para o abrir de portas a todas as doenças associadas à falta de vitaminas, tornando o nosso organismo permeável a todas as infecções oportunistas que não podem ser prevenidas por um sistema imunitário deficitário. É o caminho mais rápido para a degradação física e para a perda (inútil e sem sentido) da qualidade de vida.

 

quinta-feira, 20 de março de 2014


SES

 

Se aquela bola tivesse entrado na baliza…

Se não tivéssemos cá a Troika…

Se fossemos governados por A em vez do B…

Se tivéssemos optado por um emprego na empresa X em vez da Y…

 

Há quem desvalorize completamente estes ses e diga que não adianta nada colocar as questões neste registo. Com o devido respeito perante quem assim pensa, eu discordo completamente.

É verdade que os ses não alteram rigorosamente nada em relação ao passado. Mas estes ses levam-nos a avaliar o passado de forma mais crítica e rigorosa. E são muitos ses alternativos que nos permitem projetar o futuro de forma mais consistente.

Os ses não servem de desculpa para os erros, nem são panaceia para quem queira alterar o passado. Mas obrigam-nos a refletir e a retirar as devidas ilações do que se fez de errado.

Os ses  colocados de forma correta e no momento certo são uma metodologia adequada para analisar, planear, prever, testar, antecipar cenários e ajudar-nos a definir um rumo que devemos seguir mais ajustado aos objetivos que almejamos.

Quanto mais ses equacionarmos mais seguro será o caminho que vamos trilhar.

 


FRASES E PENSAMENTOS 


Henry Ford dizia que se podiam comprar carros de qualquer cor… desde que fossem pretos.

 

Angela Merkl não ousa dizê-lo, mas não precisa sequer de o explicitar:

”Podem fazer o que quiserem … desde que façam o que eu mandar.”

terça-feira, 18 de março de 2014

BOAS VINDAS



                    Porque mostra o teu rosto um ar tão indolente
                    e um sorriso tão triste de pássaro enjaulado?
                    Porquê olhos no chão e não no horizonte,
                   de onde as gaivotas partem no seu voo picado?


                   Corta as amarras e faz-te ao mar, ó gente,
                   trocando o rumo aos ventos do passado.
                   O futuro não espera. E partir é urgente…
                   antes que a maré vaze … e fiques encalhado!

                             In Economia em Contramão - 2008

 
Quando nos dizem que é impossível devemos responder: ”sim, mas é necessário”.
Kierkegaard 

Devemos dizer sempre a verdade. A questão é quando dizer a verdade e como.
Alex Ferguson


A autoridade não é mandar. É ter razão.
Maria José Morgado

 Precisamos de devolver à escola o papel de transmissão dos valores e não dar excessiva atenção à componente técnica. Ao entrevistar os maiores empresários todos eles fundamentaram que as falhas nas competências técnicas eram facilmente corrigidas no contexto do trabalho, mas as falhas de carácter e de relacionamento, essas, eram incorrigíveis.
Lourenço Xavier de Carvalho

 Virá um dia em que Portugal se ajoelhará diante de uma Angola livre e independente para implorar um pedaço de pão. Pode bem acontecer. Ajoelhar é um exercício que fazemos muito bem. Nem deve haver muitos países no mundo que se ajoelhem com tanto gosto e com tanta competência quanto nós.
Os Novos Maias – José Eduardo Agualusa