CAUSAS OU
CONSEQUÊNCIAS?
Hoje vou arriscar a
dizer um conjunto de banalidades, muito repetidas por muita gente. Mas faço-o
porque sei que, apesar de tudo, são ideias
não partilhadas (ou não totalmente partilhadas) por todos os nossos
concidadãos. E é necessário perceber que todas as nossas posições e decisões
como cidadãos assentam em princípios básicos do tipo dos que vou enunciar e que
traduzem valores e são princípios orientadores de toda a nossa conduta e vida
em sociedade. Quem partilha essas ideias
e valores vive num mundo completamente diferente de quem os nega. É a
própria dialética social a funcionar.
Como é normal na
vida real, em economia, por maioria de razão, os factos e ocorrências costumam
ter causas várias na sua origem e acabam inevitavelmente por gerar consequências.
A questão que muitas vezes se coloca é saber o que nasceu primeiro, se o ovo,
se a galinha, porque há um efeito de feedback em que uma dada situação é
geradora de novos factos, com retorno e influência sucessiva uns nos outros, tornando-se
por vezes difícil discernir onde está a causa primeira das coisas.
Recentemente
enunciei aqui três problemas que concentram a minha atenção: a necessidade de crescimento da economia; o
desemprego; a dívida.
Para mim (mas é meramente
a minha opinião) é muito claro: a causa primeira dos nossos problemas económicos
e financeiros é a nossa reduzida capacidade de gerar riqueza e de crescer.
Porque se (e quando) crescermos o necessário e suficiente, tudo depois se torna
muito mais fácil… desde que a seguir não se cometam asneiras graves. Bastará
então ser sensato e responsável. Mas se não conseguirmos gerar riqueza e crescer,
não há sentido de responsabilidade nem sensatez que nos valha.
É evidente que o
fraco crescimento tem causas: será o nosso baixo nível de instrução e
iniciativa; a nossa atávica aversão ao risco e a ausência de capacidade de empreender;
serão os baixos níveis de investimento, etc., etc., etc.. Mas voltamos sempre à
questão inicial, saber o que apareceu primeiro, se o ovo, se a galinha. O que é
facto é que se não ultrapassarmos este nó górdio então nada feito e não saímos
da cepa torta.
Como consequência
do nosso fraco crescimento durante muitos anos (e da sua queda abrupta nos
últimos), os nossos problemas tornaram-se insolúveis num prazo curto.
À cabeça desses
problemas de ordem prática surge, na minha maneia de ver, o desemprego, cujos
efeitos ultrapassam em muito a vertente económica, sendo particularmente graves
na esfera social, destruindo irremediavelmente a necessária coesão e o sentido
de pertença dos cidadãos, vitória que tanto esforço custou e tanto tempo
demorou até chegarmos ao ponto onde chegamos a estar. E apresentam um efeito
perverso incontornável: o desemprego faz cair as receitas (do estado e das
famílias) e eleva brutalmente os custos sociais (monetários e não monetários). Só
na parte monetária e no que respeita à segurança social, as contribuições terão
descido 400 milhões de euros nos anos 2010 a 2012 e as despesas com subsídios
de desemprego terão crescido 480 milhões.
Em minha opinião o
desemprego é o mais grave de todos os problemas que enfrentamos e que, por
isso, deve (deveria) merecer toda a nossa atenção e ocupar todas as nossas
energias. Porque tudo o resto, todos os outros problemazinhos, são insignificantes
quando comparados com este magno problema.
Provavelmente não
lhe damos a devida atenção porque, afinal, “só” 16% dos trabalhadores ativos
estarão desempregados e os restantes não sabem verdadeiramente o que é estar
desempregado (só o saberão no dia em que o drama lhes bata à porta e apenas
caso não disponham de economias que lhes permitam passar mais ou menos
incólumes ao lado do problema).
Tudo se iria resolver
muito mais facilmente se não tivéssemos resvalado para este poço de onde
demoraremos décadas (pelo menos uma) a sair. E depois surgem problemas em
cascata: prolongamento indefinido da crise, emigração, subemprego, salários
baixos, aumento da conflitualidade social, aumento da criminalidade, surtos de determinado
tipo de doenças, etc., etc..
Sempre me custou muito a perceber como é que
vários governos (por cá e lá por fora) e as respetivas sociedades civis não
elegem este como o problema dos problemas. E há até quem considere que é precisamente
na gestão adequada do desemprego que se encontrará a solução para a saída das
crises. Até pode, tecnicamente e no curto
prazo, vir daí uma parte da solução. Mas no longo prazo o valor da fatura económica
e financeira e da fratura social criadas é dramático.
Retomando o tema:
como consequência do fraco crescimento da economia e do crescimento aterrador
da taxa de desemprego, aparece o crescimento galopante da nossa dívida. Mas, enquanto
o crescimento e o desemprego são questões nucleares e estratégicas, a dívida
não passa de uma questão meramente instrumental. A dívida não é um problema em
si mesmo (até pode haver dívidas “virtuosas”)
À maneira de
Arquimedes - que pedia uma alavanca e um ponto de apoio e dizia que com isso
conseguiria mudar o mundo - eu direi algo semelhante: resolva-se o problema do
crescimento e do desemprego e a dívida
resolver-se-á em três tempos.
Mas não chega fazer
um diagnóstico correto. É depois necessário aplicar a terapia adequada. Se
falharmos num ou noutro, seja no diagnóstico seja na terapia, ficamos
irremediavelmente enredados numa teia da qual não nos conseguimos
desenvencilhar e as amarras não nos deixarão sair do fundo do poço onde caímos.