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Mistura de pensamentos, reflexões, sentimentos; um risco, assumido; uma provocação, em tom de desafio, para que outros desçam ao terreiro; um desabafo, às vezes com revolta à mistura; opiniões, sempre subjectivas, mas normalmente baseadas no estudo, ou na experiência ou na reflexão. Sem temas tabu, sem agressividades inúteis, mas sem contenção, nem receios de ser mal interpretado. Espaço de partilha, que enriquece mais quem dá que quem recebe.

quarta-feira, 29 de julho de 2015


OS GENES DA PREPOTÊNCIA ENRAIZADOS NO NOSSO ESTADO

Começo por esclarecer que não confundo estado com governo. O episódio que vou relatar pouco ou nada tem a ver com o atual governo, muito embora haja “tiques de autoritarismo” mais salientes em determinados governos, que depois se repercutem nas diversas instituições que são o braço armado do estado.

Estava eu na passada segunda-feira a fazer uma sessão de quimioterapia no IPO do Porto quando entrou no serviço um senhor em cadeira de rodas, aparentando 70 e muitos anos. Também poderiam ser apenas 60 e poucos, mas o estado de evidente degradação física levaria, nesse caso, a que aparentasse muitos mais.

A cadeira de rodas era conduzida por um garboso militar graduado, que se postou ao lado do doente desde que ele iniciou os tratamentos.

Pouco tempo passado irrompem pela sala de tratamentos 2 soldados com camisolas azuis com gravações nas costas a dizer “GUARDA PRISIONAL”. Ninguém ficou com dúvidas sobre o estatuto do doente. Mas muitos se terão perguntado se tal demonstração de força da polícia era proporcional ao perigo que o doente representava no estado de degradação física que aparentava, e certamente com a doença grave que aportava. Outro aspeto revoltante foi constatar que cada doente só poderia levar um acompanhante e aquele doente levava 3. Mais ainda – entravam na sala e movimentavam-se com o à vontade que o estatuto da autoridade lhe conferia, com os ostensivos cassetetes presos no lado esquerdo do cinturão e uma avantajada e moderna arma automática no coldre, no lado direito.

Mais um exemplo de como as nossas autoridades gostam de demonstrar a sua força perante os impotentes e indefesos. E certamente viajaram todos num carro celular com umas minúsculas janelas gradeadas, não vá o doente ser um campeão olímpico e poder escapar-lhes na sua veloz cadeira de rodas.

Há hábitos que dificilmente mudarão e regras que nunca serão adaptadas às circunstâncias reais em que os agentes de autoridade têm de atuar. Há regras que  os funcionários têm de cumprir, por mais anacrónicas que sejam e por mais inútil que seja o custo que geram.



1 comentário:

  1. Este acontecimento que aqui narras é mais um dos exemplos que demonstram que, por vezes, os agentes da “autoridade” ainda conservam os métodos fascistas do tempo de Salazar. Os nossos jovens não vivenciaram esses métodos e, também por isso, fizeste bem em narrá-lo. É uma forma de intervenção cívica. Todos temos a obrigação moral de contribuir para uma sociedade mais livre e democrática. Um abraço amigo

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