AS ELEIÇÕES PRIMÁRIAS
NO PS
A
propósito das primárias no PS vou hoje fazer uma incursão na área da análise
política. Começo por uma prévia declaração de “interesses”: não me inscrevi como
simpatizante e, consequentemente, nem sequer podia votar. Mas tal não invalida
que, como cidadão responsável, tenha opinião e tenha acompanhado com todo o
interesse o que se passou nestas primárias, que certamente vão deixar marcas na
forma de fazer política em Portugal.
Ouviram-se
muitos comentários sobre o rasto de divisão e possível fratura que esta
campanha deixaria no PS. Eventualmente com sequelas irreparáveis, dividindo o
partido a meio. Discordo em absoluto, por razões que passarei a explicar:
-
a margem obtida por António Costa foi tal que não deixa grande espaço para
contestação interna no curto prazo.
-
o inesperado surto de inscrições, a enorme afluência às urnas e votação maciça em Costa não podem significar
outra coisa que uma forte vontade de mudança. Mesmo quem seja fiel a Seguro
acaba por se vergar às razões de Costa, ao argumento de que o eleitorado
socialista estava ansioso por uma mudança na liderança, independentemente das
escassas diferenças que possam separar Costa de Seguro na futura ação
governativa.
-
os votantes em Seguro dividem-se em vários grupos. Para além dos inevitáveis
arrivistas, que mudam de barricada quando o cheiro a poder se torna mais forte
e sopra noutra direção, temos também os naturais fiéis aos lideres legítimos,
quem quer que eles sejam. Estes, com naturalidade, passarão a dar a Costa o
mesmo tipo de apoio que davam a Seguro – o espírito de tribo fala mais alto,
neste caso por bons motivos. Há depois os que votaram Seguro por um questão de
gratidão e solidariedade com quem os escolheu, mas sem motivos fortes para se
oporem a Costa. Resta, por exclusão de partes, um pequeno núcleo de seguristas
anti-costistas. Não me parece que sejam muito numerosos. E também não me parece
que, perante o resultado destas primárias e tendo em conta o perfil de Seguro,
este se vá entrincheirar com os seus indefetíveis, pronto a minar o terreno ao
novo líder ou disposto a provocar uma secessão no partido.
Se
antes das primárias Seguro tinha toda a legitimidade para liderar o partido,
compreendendo-se a sua hostilidade em relação a Costa, após as primárias é
Costa que assume redobrada legitimidade, quer pelo pronunciamento recente dos
socialistas, quer pelo score inquestionável que atingiu nas urnas.
O
PSD, que vinha rejubilando com o fraco nível os debates e com a “inevitável” fratura
que surgiria dentro do PS no pós-primárias, fica agora com razões sérias para
se preocupar. O PS saiu muito mais forte do que os analistas previam e a anunciada
fratura seguramente não se vai verificar, pelo menos com a dimensão anunciada,
com o partido dividido em duas metades. A isto devemos juntar as trapalhadas da
Tecnoforma, o desastre do Citius, a
necessidade do Crato apresentar desculpas. E no campo económico as boas
notícias, por mais verdadeiras que sejam, não terão seguramente grande impacto
eleitoral. Não haverá diminuição do desemprego (porque demasiado ténue) nem
crescimento da economia (demasiado anémico) que façam o eleitorado perdoar
estes anos de austeridade, por mais necessária que ela tenha sido. É a
realidade, estúpido!
Mesmo
sem grandes propostas concretas para apresentar, mesmo sem grandes diferenças
em relação a Seguro ou em relação às políticas seguidas por Passos, mesmo
sabendo-se que a margem de manobra dentro da comunidade e nas relações com os “mercados”
é escassíssima, está escrito nas estrelas quem vai ser o próximo primeiro
ministro de Portugal.
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