Texto

Mistura de pensamentos, reflexões, sentimentos; um risco, assumido; uma provocação, em tom de desafio, para que outros desçam ao terreiro; um desabafo, às vezes com revolta à mistura; opiniões, sempre subjectivas, mas normalmente baseadas no estudo, ou na experiência ou na reflexão. Sem temas tabu, sem agressividades inúteis, mas sem contenção, nem receios de ser mal interpretado. Espaço de partilha, que enriquece mais quem dá que quem recebe.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Os 5.com(e) na Guarda (II)

Porto Guardés
O nosso destino era Porto Guardés, um pequeno e típico restaurante de pescador, o que é desde logo a melhor recomendação quanto à qualidade, frescura e variedade do que se vai “pescar” no prato.
Pendurados nas paredes podem ver-se várias fotografias que testemunham o “terror” daquela barra nos dias de forte temporal. Podem ver-se barcos de médio porte elevados na crista de uma onda gigante como se fossem barquinhos de papel; barcos carregados de contentores com a carga a escorregar para o mar sem nada que possa já travar-lhe a marcha; ondas a bater no molhe e a levantar a água até alturas de um prédio de vários andares; homens a caminhar nas ameias do molhe, cobertos de espuma quase até ao pescoço. Simples amostras que dão para perceber que o mar ali é para homens de barba rija e de mãos calejadas.
Depois desta entrada à leão a mesa começa a exercer o seu forte poder de atratividade. E se a amesendação é muito simples, a culinária é simplesmente primorosa. Escolhemos 5 entradas: pimentos “padron”, a fazerem jus à fama que gozam por estas bandas; um
prato de mexilhões acabadinhos de cozer, de uma leveza e tenrura que confesso nunca havia provado (em Portugal apresentam-nos já frios, ficando um pouco duros e borrachentos); as gambas ao alho estavam no ponto e com um molho delicioso para demolhar o pão; do polvo à galega diga-se exatamente o mesmo que dos mexilhões - divino; os calamares esses estavam um pouco crocantes demais para o meu gosto, mas não deixaram de ser comidos até ao último pedaço.
A bebida universal foi um “vinho de verão”, uma espécie de sangria mas sem ponta de licores. Até o Jorge, um abstémio inveterado, a adotou como bebida oficial.
Depois das tapas veio o prato, ou melhor, um enorme tacho com um arroz amarelo de
açafrão, tipo paella, bem recheado de “bogavante”, partido em postas de dois dedos de grossura, para facilmente se extrair o cobiçado conteúdo. E se o arroz sobrou, tão generosa era a dose e tão bem acomodado estava já o estômago, do bogavante só sobraram as cascas, pois já costumam dizer os maiores gourmets que mais vale fazer mal do que deixar ir para o gato.
O preço só não foi “uma agradável surpresa” porque o Jorge já nos tinha avisado: pagamos 19 euros por cabeça por uma refeição que numa qualquer marisqueira portuguesa ficaria certamente bastante acima dos 30. 

Regresso a Portugal
Saímos da cidade pela marginal sul e pudemos passar por um simpático hotel (O Munho) implantado mesmo em cima do areal de uma praia calma e de águas tranquilas.
Foi rápido o percurso até Caminha, onde fomos comer um pastelinho e tomar uma bebida, sem esquecer, nunca, de levar uma lembrança às caras-metades, a quem foi decidido prometer por um dia destes um passeio ao nordeste. Mais uma vez sem exemplo, para não as habituar mal.
Deu para conhecer a casa do Mota, onde nos refastelamos num sofá e onde estre escriba passou pelas brasas quase sem dar por isso. Mas não conseguiu passar despercebido, pois todos lhe conhecem já o fraco.
Iniciado o regresso ao Porto foi por escassos segundos que chegamos ao carro sem apanhar uma valente molha. No percurso apanhamos chuva copiosa e alguns troços com umas réstias de sol, a provar a dificuldade de os meteorologistas acertarem nas previsões em todo o território e todo o tempo. Ao passar a Arrábida um outro rio corria em cima da ponte. Mas chegamos todos ao destino sãos e salvos.
A Guarda e o Porto Guardés são visitas a repetir e a recomendar vivamente à família e aos amigos.

O secretário/cronista
Alexandre Ribeiro




quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Os 5.com(e) na Guarda (I)
Mais uma crónica com a descrição de um passeio 
turístico-gastronómico do grupo 5.com(e), desta  
vez a terras de nuestros hermanos. O grupo  inter-
nacionaliza a sua meritória "atividade"                  

8 de Outubro de 2014
Correndo atrás do tempo perdido (este ano a performance gastronómica do grupo deixa um pouco a desejar, que o diga o Mota) os 5.com(e) em boa hora aceitaram a sugestão do Jorge e resolveram ir até à Guarda saborear os deliciosos mariscos da costa galega. Está bem de ver que não se trata da nossa Guarda, mas da espanhola, mesmo em frente a Caminha, do outro lado do rio Minho.
Quando o castelhano era língua obrigatória em Espanha a cidade era La Guardia. Agora que o galego passou a ter honras de língua local passou a chamar-se A Guarda. E o Monte de Santa Tecla passou a ser Santa Trepa. Esta custa mais a engolir.
Fácil é constatar a proximidade entre o galego e o português, que se reconhece em vários vocábulos locais: aqui também se diz “auga” como antigamente se dizia nas nossas aldeias; “munho” também ouvia eu dizer na minha terra quando era pequeno; o “lá em riba” cheira mesmo a português arcaico, tal como o “x” galego faz lembrar a pronúncia transmontana que transforma o “ch” em “tch”.
De Coimbra à Corunha poderia existir um país autónomo, independente, com um povo formando uma nação com maior unidade que Portugal ou Espanha. Os minhotos, transmontanos e beirões têm mais afinidades com os galegos que com os alentejanos e algarvios. Tal qual o que separa galegos e castelhanos, onde são grandes as rivalidades e escassa a proximidade.

A Guarda
A Guarda é uma cidade costeira, a mais meridional da Galiza. Uma cidadezinha de
passagem para quem vem de Baiona para Portugal, que não atrai visitantes apressados, ofuscados pela beleza e proximidade daquela vetusta cidade. E assim se passa ao lado de uma pequena pérola sem lhe dar o real valor, qual ostra escondida na sua concha, que só se descobre quando se desce até à parte baixa da cidade e se depara com um pequeno mas gracioso porto de abrigo, curiosamente sem navios à vista, protegido por um molhe com abertura estreita, para evitar males maiores em dias de tempestade. 
A marginal é lindíssima, com casario a dois passos da água e ruas em sobe e desce, a contornar as rochas que dão à praia uma forma irregular mas diferente e cativante.
A zona sul é pejada de restaurantes onde a lista é, naturalmente, recheada de peixe e mariscos.

                                   (continua)


segunda-feira, 27 de outubro de 2014


ABORTO

 

A propósito do recente sínodo dos bispos, e para quem se interessa pelo tema do aborto, recomendo a leitura da crónica de Henrique Raposo, publicada no Expresso de 11 de Outubro. Entretanto deixo aqui alguns excertos da mesma.

“O aborto é um mal, não é um direito, não é uma conquista, não é um avanço. O aborto não é uma questão simples como o casamento homossexual. Dois adultos vacinados podem casar no civil. Ponto final”.

“Lamento, mas uma mulher que aborta dezenas de vezes num curto espaço de tempo é uma criminosa. O protocolo de acesso ao aborto tem de ser alterado. Repare-se que não estou a dizer que o aborto tem de ser proibido. Neste mundo tenho de chegar a um compromisso com quem pensa de forma diferente da minha”

“Anabela tinha 15 anos quando engravidou. Ela recusou a via fácil do aborto, mas depois foi encarada como uma quenga pelas paroquianas, as senhoras que distribuíam os panfletos do “não ao aborto”. É este o problema de boa parte dos apoiantes do não, acham que o catecismo é mais importante do que a caridade, o perdão e a vida. A igreja que luta contra o aborto não pode olhar de lado para as mães adolescentes, mães solteiras e mães em união de facto”.

“O caminho aberto pelo papa Francisco é a forma de o “não” rever a sua arrogância moral. O papel do cristão não é julgar a partir de cima. É muito fácil ser do “não” quando se está numa família confortável, onde há dinheiro, onde mais um filho não faz diferença”. 

 

sábado, 25 de outubro de 2014


O cobrador de fraque
ou

IVA – um imposto cego e estúpido

 

A discussão do orçamento do estado é um momento privilegiado para os deputados e os cidadãos em geral refletirem sobre a forma de o estado se financiar para poder cumprir adequadamente as suas funções.

Por muito que nos custe os impostos são um dever porque traduzem uma necessidade equivalente ao ordenado para uma família. É preciso é que a forma de “sacar” dinheiro ao cidadão seja justa e equilibrada.

Sem quaisquer pretensões, mas apenas para suscitar reflexão, deixo aqui algumas cogitações, de onde antecipo desde já conclusões pouco usuais.

O IRS, com todas as imperfeições que lhe são reconhecidas, acaba por ser um imposto que traduz uma grande preocupação com a justiça retributiva que uma sociedade evoluída sempre persegue. Já o IVA pouco passa de uma forma prática e terrivelmente eficaz de encher os cofres do estado.

Usando a caricatura, que normalmente é a melhor forma de fazer perceber uma ideia ou uma mensagem, vou aqui fazer uma demonstração.

O sr. José e  sr. António são dois vizinhos, habitantes de uma pequena aldeia do interior, meia escondida e isolada do mundo. O sr. José faz trabalhos diversificados de construção civil, nomeadamente como pedreiro, trolha e afins. O sr. António trabalha igualmente na construção civil, mas voltado para as artes de carpintaria e serralharia. Ambos obtém um rendimento médio mensal da ordem dos mil euros. Ambos têm uma família a sustentar. Ambos habitam em moradias típicas de aldeia, com tudo o que é essencial mas sem ponta de luxos, pois o ordenado só lhes permite levarem uma vida decente, de cara levantada.

Num dia de forte invernia abateu-se sobre a aldeia uma tremenda tempestade que provocou sérios danos nas habitações do sr. José e do sr. António, que ficaram meias destruídas. Como trabalhavam em áreas complementares combinaram ajudar-se mutuamente a recuperar as respetivas habitações. Passaram dois meses em obras, cada um com um mês de trabalho na própria casa, na arte que dominava, e outro mês a fazer o mesmo na casa do vizinho.

É óbvio que foram dois meses em que ficaram privados da sua fonte de receitas, para além dos elevados gastos em materiais que foram obrigados a suportar.

Entretanto, massacrados com as campanhas contra a evasão fiscal e puristas do cumprimento das suas obrigações de cidadãos, entenderam que deveriam faturar um ao outro o tempo de trabalho na casa do vizinho. Assim, o sr. José faturou ao sr. António 1.000 euros respeitante aos trabalhos de trolha e pedreiro que executou na casa deste. Por sua vez o sr. António também faturou ao sr. José 1.000 euros pelos trabalhos de carpintaria e serralharia. Tudo conforme a lei, tudo limpinho.
É evidente que no mês seguinte apareceu o cobrador de fraque a cobrar 230 euros a cada um destes dois exemplares cidadãos que haviam ficado sem casa e privados de receitas durante dois meses.    



sábado, 18 de outubro de 2014


COLIGAÇÕES

Participar em governos é uma decorrência da atividade partidária.

Passados 40 anos já seria tempo de vencer o trauma. De derrubar um muro que ignora que não há protesto consequente sem alternativa e não há alternativa sem soluções de poder. Perante os efeitos concretos desta crise as pessoas já se contentam com a promessa de resistência.

O que interessa às pessoas não é se o PS tem parceiro. É o que muda nas suas vidas. Quem se apresenta como alternativa ao voto do PS, com a real disposição de participar num governo de esquerda, tem de se distinguir do PS. Começando por uma agenda programática muito mais clara. Que, na salvaguarda do Serviço Nacional de Saúde, da escola pública e na Segurança Social, ultrapasse o mero discurso defensivo.

Todas as escolhas dependem de uma: a forma como lidar com os constrangimentos externos, a começar pela dívida e pelas metas do tratado orçamental. Na prática trata-se de saber com que dinheiro vai a esquerda cumprir a promessa de travar a austeridade e defender o estado social.

Quem se conseguir distinguir do discurso difuso e da prática temerosa do PS sobre isto tem condições para se sair bem. Mas não pode marcar tantas e tão radicais linhas vermelhas que as pessoas sintam que só se quer, mais uma vez, provar que o PS não é de esquerda.

É um caminho muito estreito. Mas para quem se contenta em picar o ponto na resistência sem alternativa, nem acha que isso se resolve com salvadores da pátria cheios de carisma, é este o caminho que sobra.

 Daniel Oliveira – Expresso de 11 de outubro

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Os G5.com(e) na Ribeira do Porto


10 de setembro de 2014
Quase 3 meses depois do último almoço (ó malta temos de trabalhar a outro ritmo, assim não pode ser. Qualquer dia o patrão despede-nos!) o Grupo 5.com(e) desceu à Ribeira do Porto para festejar a entrada na reforma do único elemento do grupo que, apesar de inativo, ainda estava no ativo, e estava a estragar a estatística: o Alexandre.
Ufa!!! Finalmente! - disse ele, que há tanto tempo ansiava por este dia.

O português é uma língua traiçoeira
O tempo estava algo incerto, mas agradável para passear. O ponto de encontro foi na estação de S. Bento, mas à hora combinada o Jorge estava à espera dos colegas… na estação de Valadares. E assim se prova, mais uma vez, a extrema dificuldade em pôr duas pessoas em sintonia, mesmo quando o tema é inócuo e a mensagem é aparentemente transmitida na perfeição, não deixando dúvidas ao transmissor nem ao receptor. Imaginem só as confusões que se poderiam gerar se houvesse uma conjugação de circunstâncias que originassem um imbróglio.

A caminho da Ribeira
O caminho de S. Bento à Ribeira, quer pela Mouzinho da Silveira quer pela rua das Flores apresenta um intenso movimento que contrasta vivamente com o fluxo de pessoas nessas ruas há uma dezena de anos atrás.
O casario degradado deu lugar a uma elevada percentagem de edifícios excelentemente recuperados.
O comércio mudou de ramo, centrando-se agora particularmente na restauração. Os portuenses que por aí vadiavam deram lugar a uma indescritível mistura de raças e de línguas, onde um poliglota não chega para as encomendas e um etnógrafo fica todo baralhado.
O que isto mudou em meia dúzia e anos!!!

A Ribeira do Porto
A velha Ribeira é a grande sala de visitas do Porto. A cada passo tropeçamos em espanhóis, italianos, franceses e ingleses. Depois há aqueles que arranham uns sons guturais que ninguém entende. E há aqueles de olhos em bico, elas com sombrinhas de um euro, de usa e deita fora, certamente produzidos por garotos de 8 ou 10 anos, que trabalham 15 horas por dia por uma malga de arroz, naquelas oficinas indescritíveis que mais parece estarmos no meio de aterro sanitário com cobertura a telhas de fibrocimento.
A Ribeira fervilha de vida e o Douro é uma passerelle de pequenos barcos a fazer o cruzeiro das 6 pontes, por 10 euros. 
Do outro lado do rio destaca-se o cais de Gaia, a pedir meças à Ribeira do Porto em beleza e movimento, com o Yeatman sobranceiro no cimo da colina, de onde se observa um Porto singular a partir de um posto de vigia privilegiadíssimo.

Ter amigos e usufruir das vantagens de passar à reforma
Num dos muitos bares/restaurantes para turista regalar a vista e apreciar a nossa gastronomia, tomamos uma bebida. O grupo
aproveitou para oferecer ao Alexandre um livro sobre economia, para ele aprender mais alguma coisa dessa arte esotérica, para muitos uma adivinhação de quem pouco sabe, pois estão sempre a falhar os prognósticos. A prenda foi complementada com um CD da Ana Moura – “Leva-me ao fado”, um bestseller da canção nacional. Surpresa para o homenageado, que não esperava nada daquilo.

E vamos ao que aqui nos trouxe
Estava na hora da papa e o objetivo seguinte foi arranjar o melhor poiso. Escolha deveras difícil, tal a variedade da oferta. Mas a maior parte dos lugares de varanda virada para o rio eram mesas para duas pessoas
e o cardápio era próprio para turista provar e pagar.
Acabamos por fazer uma escolha nem carne nem peixe; nem tasca nem muito requinte; nem caro nem barato. O preço por pessoa ficou abaixo dos 20 euros, mas sem sobremesas e com a opção por cerveja em vez do vinho. O serviço foi muito demorado, pois em lugar de optarmos pelo prato do dia escolhemos pratos complicados: filetes de bacalhau e polvo à lagareiro.
Durante o repasto tivemos direito a 2 concertos a solo por verdadeiros artistas, estrangeiros, com aparência de romenos.

Igreja de S. Francisco
Findo o repasto, e antes de regressarmos a casa, fomos tentados a uma visita à igreja de S. Francisco. Deparamos com 2 seguranças, que nos queriam esfolar 3 euros e meio a cada um para dar uma mirada à igreja, às catacumbas e ao museu. Optamos por seguir o exemplo de uma turista brasileira, que deu meia volta e terá ido gastar os euros noutras paragens. Ou noutras viagens, pois mesmo aqui passam imensos autocarros turísticos, daqueles descobertos que dão a volta à cidade e que ainda há dois ou 3 anos só conhecíamos das visitas a cidades estrangeiras.
O que o Porto mudou em meia dúzia e anos! E não passamos da Ribeira.
Valadares, 10 de Setembro de 2014