EM DEFESA DAS SCUT’S
(III)
3
– A solidariedade nacional e o princípio do utilizador pagador
O princípio do
utilizador pagador é uma boa regra de gestão e um fator de equidade. Mas esses
conceitos precisam de ser aprimorados. Se compete ao estado a manutenção das
estradas municipais e a obrigação de proporcionar qualidade de vida aos
cidadãos que pagam os seus impostos, se o imposto automóvel e sobre os
combustíveis é já tão elevado, o apregoado princípio do utilizador pagador não
pode ser uma regra universal e cega, nem simplesmente sujeita aos ditames
economicistas analisado por quem tem vistas curtas.
Não esqueçamos que é
ao estado que compete dotar o país das necessárias infraestruturas rodoviárias,
utilizando os impostos que cobra aos cidadãos. Vou falar de cor, mas não
deverei andar muito longe da verdade se disser que, esquecendo a nossa moderna
rede de autoestradas e vias rápidas, a nossa rede de estradas nacionais deverá
ter mais de um século, sem grandes alterações no seu traçado e no seu perfil,
praticamente só tendo melhorado o piso. Ora, num país com tantas assimetrias
regionais, nomeadamente no confronto litoral/interior, é absolutamente
necessário – e compete ao estrado fazê-lo - meter este dado na equação, sob
pena de ficarmos com o interior completamente despovoado (ainda mais) e o
litoral sobrelotado. Depois não se queixem, nem se lamentem, se quiserem ir às
aldeias tradicionais e só encontrarem ruínas; não se queixem se quiserem visitar
o nosso riquíssimo património natural e não tiverem quem os acolha; não se
queixem de querer saborear a nossa preciosa gastronomia regional e encontrarem
os restaurantes fechados; não se queixem de não ver no mercado os nossos
apreciados produtos regionais como o fumeiro, os queijos artesanais, o azeite e
muitos outros produtos que fazem as delícias dos apreciadores; não se queixem
dos incêndios resultantes do abandono das matas nas zonas mais despovoadas. E
como desenvolver o turismo em zonas como o Douro e Trás-os-Montes se só dispusermos
de uma rede de estradas com mais de um
século?
O desenvolvimento
assimétrico do país e a desertificação do interior têm um custo brutal. Algum
dia, quando acordarmos, pode ser tarde demais para corrigir os erros entretanto
cometidos. Mas no presente há já dados visíveis e notórios dessa realidade.
E qual a
racionalidade de acabar com algumas Scut’s se o trânsito caiu drasticamente, se
as receitas ficaram muito aquém do esperado, se os custos a pagar ao
concessionário aumentaram em vez de diminuírem, fruto de contratos leoninos e do
sistema de rendas garantidas? E que dizer de algumas cidades, vilas e aldeias que
se viram de novo devassadas por um trânsito infernal? E quem trabalha longe e passou
a gastar muito mais tempo nos transportes, tendo de sair de casa muito mais
cedo e chegando mais tarde, suportando filas a que já não estava habituado? E o
estado que passou a gastar muito mais dinheiro na manutenção de estradas
municipais, que passaram a ficar muito mais degradadas em muito menos tempo? E
que dizer de soluções abusivas e à margem das próprias regras definidas pelo
estado, como a colocação – absurda - de portagem à passagem por Francelos, em
lugar de ter o pórtico apenas à saída de Miramar? E que pensar das coimas e
custos processuais de milhares de euros com que alguns cidadãos estão a ser
brindados devido às limitações e erros do sistema ou a simples abusos de quem
pode e manda? (Veja-se um artigo publicado no JN de 12 o corrente)
O fim de algumas
(repito – algumas) Scut’s que passaram a autoestradas está já a demonstrar o
erro de decisões precipitadas, tão ou mais graves que o erro de algumas
construções que pecaram por excesso e em relação às quais não se pode recuar e
o que há a fazer é dar o melhor aproveitamento possível às infraestruturas de
que agora dispomos.
(continua)
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