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Mistura de pensamentos, reflexões, sentimentos; um risco, assumido; uma provocação, em tom de desafio, para que outros desçam ao terreiro; um desabafo, às vezes com revolta à mistura; opiniões, sempre subjectivas, mas normalmente baseadas no estudo, ou na experiência ou na reflexão. Sem temas tabu, sem agressividades inúteis, mas sem contenção, nem receios de ser mal interpretado. Espaço de partilha, que enriquece mais quem dá que quem recebe.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014


MISSÃO EM ANGOLA (V)

Lobito

Lobito, a cidade onde fiquei instalado e onde fica a sede dos Caminhos de Ferro de Benguela, é uma “pequena” cidade tipicamente colonial, com um dos maiores portos de África, onde se inicia/termina um longo percurso ferroviário com mais de 1.300 kms, que se prolonga depois para o antigo Congo belga e Zâmbia, permitindo ligações ferroviárias que chegam a Moçambique, atravessando por isso o continente desde o Atlântico ao Índico.

Noto-lhe algumas semelhanças com Aveiro: uma cidade plana, com alguns canais, com exploração de salinas que eram o habitat natural de uma colónia de flamingos. A dimensão do casco urbano não será muito dissemelhante de Aveiro, tal como os números respeitantes à população residente. Assumiu o estatuto de cidade há precisamente 100 anos (2 de setembro de 1913), por decreto de Norton de Matos.

Hoje a região do Lobito regista quase um milhão de habitantes (cerca de 850 mil) e apresenta uma malha urbana/suburbana cheia de contrastes:

- aquilo a que poderemos chamar o casco urbano da cidade foi traçado na época de domínio português. Lobito é uma cidade bem rasgada que, no auge do período colonial (em meados do século XX) teria excelentes estruturas para a época. Deveria ser uma bela cidade para viver, um local aprazível, uma zona de forte atratividade, com oportunidades de trabalho e de negócios. A construção seguia uma cércea baixa, que obrigou a cidade espalhar-se na horizontal. Apresenta largas e retilíneas avenidas, de um só sentido, com estacionamento dos dois lados, sobrando ainda espaço que daria para 3 faixas de rodagem. Mas a cidade parece que parou no tempo. O parque habitacional está em geral bastante degradado, com vários prédios em estado lastimável, que hoje em Portugal ninguém gostaria de habitar. Os espaços comerciais ou estão recuperados, e apresentam nesse caso bom aspeto, ou estão encerrados e com ar de degradação. Se se procedesse a uma “limpeza” e recuperação geral dos prédios atuais passaria a apresentar interessantes espaços públicos, não desmerecendo das nossas cidades. Além disso há a registar o pó (negro) que nesta época se acumula por todo o lado, desde as árvores às casas, às ruas e aos automóveis.

   - a periferia da cidade é um desordenado e caótico conjunto habitacional sem fim à vista e que se estende pelos morros acima, onde residem algumas centenas de milhar de pessoas, em condições regra geral deploráveis, quer ao nível das habitações, arruamentos ou infraestruturas necessárias a um espaço habitável com a qualidade que hoje exigimos em Portugal. O meio de deslocação com que tropeçamos a cada passo é a motorizada, que se vê por todo o lado às dezenas.

   - uma outra zona, interessante, resulta de construção moderna em zonas antes desertas. Aí se concentra hoje o moderno comércio. Edifícios novos de raiz, que, pela qualidade do edificado e pelo nível das lojas e variedade dos artigos que aí se transacionam e pela facilidade de acessos não fariam má figura em Portugal.

- por último, a sala de visitas da cidade, uma zona com grande beleza natural e em bom estado de conservação - a Restinga, de que voltarei a falar com mais pormenores.

(CONTINUA)

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